(Romagem ao cemitério de Cabanas de Viriato, com deposição de coroa de flores, a 1 de Novembro de 2008)
É para mim um enorme privilégio, enquanto cidadão e cabanense, poder ter a honra de proferir, em acto público, e perante os meus concidadãos e entidades aqui presentes, algumas breves palavras dirigidas à memória de Aristides de Sousa Mendes, ilustre filho desta terra, cujo exemplo de fervor humanista é hoje justamente reconhecido e enaltecido em todo o mundo.
A história já nos ensinou tudo (ou quase tudo) sobre Aristides de Sousa Mendes: os números dos milhares de vidas que salvou; as atribulações que corajosamente enfrentou em 1940, ano da invasão da França pelas tropas nazis; a perseguição implacável a que o poder de então o sujeitou por virtude da sua desobediência à sinistra circular 14; a punição, privação, ostracismo e miséria a que foi ignobilmente condenado no seu país, na parte final da sua vida.
São factos históricos retratados, documentados, passados pelo crivo do testemunho inter-geracional, factos que só mentes insanas ou mal intencionadas podem tentar desmentir ou desvalorizar.
A história está aí, pois, para que a divulguemos e a ajudemos a germinar exemplos de humanismo como aqueles que Aristides Sousa Mendes protagonizou.
Ele não quereria, com toda a certeza, que neste momento nos bastássemos com a contemplação do seu legado, numa atitude passadista e inconsequente.
A história é a memória colectiva de um povo. Mas só fará verdadeiro sentido se virada para o devir, se a projectarmos como património de valores e exemplo de vida.
Aristides de Sousa Mendes deixou-nos um legado histórico que teremos que saber honrar e cumprir. E a única forma de cumprir verdadeiramente esse legado é assumir um compromisso de esclarecimento e divulgação da sua acção humanista durante os primeiros anos da 2ª Guerra Mundial. E de, em consequência, fazer enraizar e disseminar as sementes dos valores humanos por que se bateu.
O maior tributo que poderemos prestar à sua memória é o de manter vivo o seu exemplo e a mensagem que ele encerra. E isso passa necessariamente pela obrigação de dar a conhecer a sua acção humanitária às gerações vindouras, divulgando-a nas escolas e nas associações de juventude, levando a cabo iniciativas que perpetuem valores como a liberdade, a paz e a dignidade humana, que Aristides de Sousa Mendes, em vida, soube servir com tanta coragem, abnegação e dignidade.
Creio ser esta a melhor maneira de honrar a sua memória, para que o seu gesto não tenha sido em vão. Para que Auschwitz e Birkenau não sejam mais possíveis.
É que – não o esqueçamos – Junho de 1940 ... foi ontem!
E, utilizando as palavras de Martin Luther King, insurgindo-se contra a inacção das pessoas de bem, « O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons...»
Gostaria, neste local e neste momento, de reproduzir solenemente algumas palavras escritas por Aristides de Sousa Mendes, a 17 de Julho de 1941, em carta dirigida ao seu advogado Dr. Palma Carlos, a agradecer-lhe tê-lo defendido perante o tribunal:
«Realmente desobedeci, mas a minha desobediência não me desonra. Não cumpri instruções que significavam, a meu ver, perseguição a verdadeiros náufragos que procuravam, a todo o custo, salvar-se da sanha hitleriana. Acima dessas instruções estava para mim a lei de Deus, e foi essa que eu procurei cumprir, sem hesitações nem cobardias de poltrão. O verdadeiro valor da religião cristã está no amor do próximo, e eu, sendo cristão, não podia fugir do seu império. »
Alguém disse que os homens são do tamanho dos valores que defendem. Aristides de Sousa Mendes tem o tamanho do mundo!
Aqui o assinalamos, com toda a justiça, em sinal de singela homenagem à sua memória.
Palavras proferidas por Luís Pais Borges junto ao jazigo da família Sousa Mendes, cerca das 12h, dia 1 de Novembro de 2008.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário